“Como escritor sempre os políticos me divertiram,
como indivíduo considero-os uma classe que merece o desdém que se nutre pelo
lojista que cientemente rouba.
Por isso continua a fazer-me espécie a febre com
que, num país que alcançou um elevado palmarès de corrupção e
pulhice política, tantos cidadãos se devotem a discutir, analisar, prever, a
reprovar ou aplaudir os ditos, as façanhas e o pensamento dos governantes.
Terá essa gente uma fé que a mim falta?
Conhecimentos secretos? Poderes divinatórios? Recebem eles a horas mortas, em
lugares escusos, as confidências dos que verdadeiramente podem e sabem? Estarão
convictos de que penetram a razão das caretas do Senhor Presidente da República
ou das poses do Senhor Primeiro Ministro? As promessas do ministro A.? A
arrogância do ministro B.? Terão talvez a louca esperança de que, nos cafés,
nos comícios, nos jornais e nos blogues, o seu palavreado faz sentido ou resulta?
Que por falarem alto a agitação tem efeito? Que o voto realmente conta?
Esquecido do respeito que devo ao meu semelhante e
às suas opiniões, quase me ia atrevendo a chamar a tudo isso uma forma de
onanismo.”
J. Rentes Carvalho
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