sábado, 22 de setembro de 2012

Posso pedir um disco?

 

Ai Senhor das Furnas, 
Que escuro vai dentro de nós. 
Rezar o terço ao fim da tarde 
Só para espantar a solidão. 
Rogar a Deus que nos guarde,
 Confiar-lhe o destino na mão
Que adianta saber as marés, 

Os frutos e as sementeiras, 
Tratar por tu os ofícios, 
Entender o suão e os animais, 
Falar o dialecto da terra, 
Conhecer-lhe o corpo pelos sinais?
E do resto entender mal, 

Soletrar assinar em cruz,
 Não ver os vultos furtivos, 
Que nos tramam por trás da luz.
Ai, Senhor das Furnas, 

Que escuro vai dentro de nós.
 A gente morre logo ao nascer 
Com olhos rasos de lezíria. 
De boca em boca passar o saber, 
Com os provérbios que ficam na gíria.
De que nos vale esta pureza, 

Sem ler fica-se pederneira. 
Agita-se a solidão cá no fundo, 
Fica-se sentado à soleira, 
A ouvir os ruídos do mundo 
E a entendê-los à nossa maneira.
Carregar a superstição 

De ser pequeno ser ninguém 
E não quebrar a tradição 
Que dos nossos avós já vem.

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